O ORIENTADOR LITERÁRIO é um profissional que acompanha, ensina e participa de todo processo de criação de um livro. Um profissional técnico, especializado em criação, um professor de escrita e um parceiro, ao mesmo tempo. Experimente, é terapêutico e libertador. Perpetue as histórias que só você tem para contar.
É assim que o Sr. Otávio é conhecido e cumprimentado por
todos naquele quarteirão de Copacabana. Seu Tatá é conhecido por todos os comerciantes
legais e ilegais daquela região. Depois da morte da esposa, a manifestação de
solidariedade de todos o deixou ainda mais próximo e grato a todas aquelas
pessoas que o adotaram. Graças ao apoio que recebeu, em vez de se trancar em
casa, passou a circular pela região só para conversar com o pessoal. Após o
luto, recuperou-se de tal forma que poucos poderiam imaginar.
Não tinha filhos,
morava sozinho e tinha uma aposentadoria que lhe bastava. Mas, o que mais
colaborou para a recuperação do seu Tatá, depois da viuvez, foi o reencontro
com os amigos da juventude que ainda estavam vivos, depois que a filha do vizinho
o convenceu a comprar um notebook e abriu uma conta para ele em todas as mídias
sociais.
Ele se deslumbrou. Passava horas e horas procurando antigos
amigos, namoradas, conhecidos, recortes de jornais de época, vídeos antigos e
tudo mais que fazia parte de sua memória afetiva. Em algumas tardes, voltava no
tempo.
Segundo seu médico, ele vinha apresentando melhoras em todos
os índices e marcadores que os exames podem mostrar. Seu estado de espírito
parecia ter sido mergulhado na fonte da juventude. Para completar o quadro, encontrou
5 amigos que ainda estavam vivos, pelo facebook e, pasmem, que ainda moravam em Copacabana.
Passaram a se encontrar todos os dias na praça do Bairro
Peixoto, onde se divertiam e partilhavam memórias e vivências.
Seu Tatá parecia ter voltado à juventude. Até o dia em que
acordou com o barulho de máquinas bem embaixo de sua janela. Era no terreno ao
lado, que estava sendo preparado para virar um galpão para estacionamento.
Ele aguentou o barulho por vários dias, apesar daquilo o
irritar profundamente.
Mas, fazer o quê? Pelo menos durava só até umas 5 horas
da tarde.
Até o dia, ou melhor a noite, em que a obra do piso
cimentado estava no final e três máquinas semelhantes a grandes enceradoras domésticas
antigas, do seu tempo, invadiram a noite com seus barulhos não muito altos, mas
extremamente irritantes.
Quando Seu Tatá acordou de um cochilo, às 8 horas da noite,
as máquinas ainda estavam trabalhando e aquilo o irritou ainda mais. Com
certeza, aqueles infelizes iriam até às 10 da noite com aquele barulho. Se não
parassem ele ligaria para a polícia, afinal é para isso que existe a Lei do silêncio,
pelo menos na época dele existia e as pessoas e as obras respeitavam certas
convenções de boa vizinhança.
Às 10:30 da noite não havia nem sinal de que as máquinas
iriam parar. À essa altura, Seu Tatá já estava bastante irritado e sentia-se
enraivecido como há tanto tempo que nem se lembrava mais. Pegou o telefone para
ligar para a polícia e pensou que de nada adiantaria. Iria demorar tanto até a
polícia chegar, se chegasse, que os operários já teriam parado e de nada teria
adiantado sua irritação e o chamado telefônico.
Mas, ele precisava fazer alguma coisa.
Foi até a geladeira se lembrando de como era bom ter sido
um moleque bicho solto...Só de pensar no que iria fazer sua pressão arterial
diminuiu, sua glicose baixou e quase teve uma ereção.
Pegou uma caixa de ovos, apagou as luzes do apartamento,
fechou as cortinas, mas não as janelas. E começou a jogar os ovos nos três
homens que operavam as máquinas e em mais um que fiscalizava. Jogava e se escondia,
rindo sem parar. Cada ovo jogado era uma sessão de risadas. E o velho tinha uma
excelente mira...
O que lhe causou uma crise de riso impagável.
Não precisou mais do que meia dúzia de ovos para que a primeira
máquina fosse desligada e em seguida as outras.
Todos
gostaríamos de ter nosso próprio anjo, exclusivo, nos protegendo, nos
acompanhando e fazendo nossa guarda dia e noite.
Com
este guia prático você vai ver que isto é possível, basta vencer a barreira do
absurdo. Isso é muito fácil, já que ela não existe mesmo.
Para
começar a procurar seu anjo faça o oposto, identifique seu demônio particular. Esses dias estressantes facilitam bastante essa tarefa, e a toda hora ele se manifesta. Primeiro, perceba
que seu principal antagonista é você mesmo. Somos nossos piores e mais
implacáveis sabotadores e críticos. Se a gente pudesse quebrar a própria cara,
de vez em quando, não seríamos assim.
Por
isso, se não podemos vencê-lo, juntemo-nos a ele, no caso, a nós mesmos. Às vezes, transformamos nossas próprias vidas num verdadeiro inferno, como se estivéssemos com o diabo no corpo, nesses momentos, não vacile, atraque-se com seu capeta e mostre quem manda na porra toda.
A
primeira providência é, numa ocasião propícia, convidar seu crítico para
conversar. Ofereça-lhe um chazinho, todo crítico adora um chazinho. Durante a
conversa, faça-o ver que ele o está se criticando muito severamente e revele a
grande verdade, ele é você. No começo ele pode relutar um pouco, mas depois,
fatalmente terá que concordar. Ou então, se interne logo porque seu caso está
perdido. E, não adianta partir para a agressão, eu garanto que você vai
apanhar.
Passada
esta fase meio insana, vamos para a segunda etapa.
Que é,
ainda, mais insana.
Essa
prática seguinte tem suas vantagens. Você pode praticá-la em casa, sozinho, não
paga dízimo e não tem sermão de ninguém, nem tem que ler nada. E não precisa
ver programa de pastor gritando em canal de televisão.
O
incenso é opcional, não é necessário.
Agora
vamos lá; na sua sala ou quarto, fique o mais relaxado que puder, sente-se no
chão e assuma a posição de Lótus.
Pode
ser também a posição de Ferrari ou McLaren.
Essas
posições importadas geralmente são bastante confortáveis. Mas, tem gente que se
arranja bem até com a posição Fiat Uno. Tem que ter muito mais flexibilidade, é
claro.
Ah,
antes coloque um som instrumental que você goste, porque se deixar para colocar
depois de fazer a posição escolhida, vai dar o dobro do trabalho.
Comece
a pensar em quantos Eus existem em você.
Acesse
as memórias de você quando criança, imagine que está se encontrando com ela,
com a criança cheia de sonhos que você foi, convide ela para brincar, pergunte
o que ela sente, o que ela precisa, o que lhe falta.
Chame
seu autocrítico, também, e apresente-o a ele mesmo. Perceba toda a abrangência de sua própria pluralidade.
Desculpe
seus erros, faça um pacto de amizade consigo. Faça a paz entre todos os seus
Eus.
Grande
parte das pessoas esconde sentimentos de si mesma. Ou seja, nem amigos
confidenciais de si mesmos são.
Essa é
a pior solidão, a ausência de si mesmo.
Temos
que nos aceitar, ficar do nosso lado, isso é fundamental. Mesmo quando não
compreendemos por que fizemos aquela merda colossal! Quanto mais difícil é uma
situação, mais fortemente precisamos contar com nosso próprio apoio. Sem o
acolhimento e a amizade de si mesmo, não há santo, nem anjo, que aguente viver.
Seu
anjo da guarda existe e está esperando por esse encontro, há tanto tempo quanto
você.
Agora,
levante-se e fique bem em frente ao espelho.
Se olhe com toda a atenção, sem
pensar em nada, apenas se olhe, sem pressa, vá se reconhecendo, lentamente, em
cada mínimo detalhe, até se enxergar profundamente, com os olhos de sua própria
alma.
E,
então sorria.
Imediatamente,
você verá o seu anjo lhe sorrindo de volta.
De repente, ele começou a ouvir uma voz em seus sonhos.
Não eram vozes, no plural, era apenas uma voz específica.
A
lembrança era clara e diferente de tudo que já havia sonhado antes.
Acordou assustado, ainda não havia amanhecido. Sua
respiração estava ofegante e demorou até saber onde estava; deitado em seu
quarto, em sua cama.
Não conseguiu mais dormir, estava muito impressionado com
aquela voz que não pôde identificar. Não era conhecida, nem familiar, mas era
aconchegante.
Foi até a cozinha ferver água para fazer o café. Quando
voltou e abriu a torneira da pia para escovar os dentes, a voz já não lhe soava
tão clara, tão pouco se lembrava do que lhe dissera.
Quando estava na varanda tomando seu café forte, puxou
inutilmente pela memória, que parecia se distanciar como uma gaivota voando em
direção ao horizonte. O nascer do sol
estava lindo e meia hora depois já não se lembrava de mais nada. A não ser que
uma voz num sonho lhe causara uma impressão profunda que ele não conseguia
tirar de seus pensamentos. Esse foi o primeiro dos muitos eventos que estavam
por acontecer.
O desenrolar do dia e dos afazeres terminaram por apagar
completamente a lembrança. Após o almoço, aquele evento havia fugido
completamente de sua memória.
Duas semanas após, o mesmo evento se repetiu com uma
fidelidade improvável. Sua angústia foi muito maior do que no despertar da
primeira noite. A única diferença, e mais agoniante, é que nessa segunda vez
conseguiu reter ainda menos detalhes do que no evento anterior. Apenas o
suficiente para se aproximar da certeza de que fora absoluta e estranhamente
igual.
Dessa vez, demorou mais tempo para retornar a sua rotina sem
sentir aquele incomodo esquisito e inexplicável.
Não demorou para que o evento se repetisse. Apenas alguns dias
e dessa vez o impressionou ainda mais, a ponto de atrapalhar uma série de
acontecimentos profissionais de sua rotina. Não conseguia se concentrar em mais
nada. Naquela noite, tomou dois gramas a mais de ansiolítico e mais um
antialérgico para adormecer mais rápido. E foi dormir tentando lembrar-se de
qualquer detalhe a mais sobre aquela voz. Sequer conseguia definir se era
masculina ou feminina. Menos ainda sobre o que falava.
Na repetição seguinte, a coisa se complicou ainda mais.
Quando acordou, após o mesmo sonho, manteve-se parado na mesma posição porque
haviam lhe falado que isso facilitava a retenção da lembrança. Passados alguns
minutos, não achou que estivesse fazendo algum efeito no seu caso. Até chegar
ao banheiro e, enquanto colocava pasta de dentes na escova, resmungou:
— Se essa voz falasse quando estou acordado seria muito mais
fácil entender... ô voz zinha burra!
Talvez, por já não estar levando aqueles sonhos tão a sério,
acordara de bom humor naquele dia. Até ouvir nitidamente:
— Então está certo. Você se acha capaz de me ouvir
conscientemente? Espero que sim...
Rodrigo foi encontrado desacordado no banheiro pela
diarista, que o acordou tão assustada quanto ele.
Acontece que, daquela
manhã em que desmaiara até o dia em que foi encontrado, havia se passado três
dias.
O evento se tornava mais surreal pelo fato de que a diarista
havia ido trabalhar na casa de Rodrigo naqueles mesmos três dias e, segundo seu
relato, ele não estava em casa. Ela limpara a casa inteira, incluindo o
banheiro onde ele foi encontrado e, definitivamente, ele não se encontrava
naquela casa durante aqueles dias.
Ela imaginou que ele estivera viajando pois, durante aqueles
três dias nada na casa fora mexido. Como se ninguém, além da própria diarista,
houvesse estado ali.
Na agência de propaganda onde trabalhava, ele também faltara
aos mesmos três dias úteis.
Sua última lembrança era a imagem da expressão aterrorizada
de seu próprio rosto no reflexo do espelho.
Ele nunca conseguiu se lembrar de nada do que aconteceu
naqueles dias subsequentes. A única
coisa diferente que havia restado daquela experiência surreal eram as manchas
de dois filetes de sangue coagulado, uma em cada ouvido. E Nada mais.
Após se alimentar, deitou e demorou algumas horas até se sentir
recuperado o suficiente para levantar com um estranha e urgente determinação de
ir buscar seu filho no colégio naquele dia. Ele nunca fazia isso, era
divorciado e a guarda do filho era compartilhada. O menino já tinha 14 anos e
ia e voltava sozinho de ônibus comum, do colégio para a casa da mãe, onde
morava.
Ele sabia disso, e o próprio filho não gostava que o pai
fosse buscá-lo na porta da escola. Mas, Rodrigo estava agindo como se houvesse
sido programado, como um robô, para desempenhar aquela tarefa. Ele não estava
pensando, apenas agindo.
Quando parou o carro no ponto de ônibus em frente à escola,
viu o filho e mais dois amigos sentados no ponto de ônibus aguardando o
coletivo. Abriu a porta do carona, chamou o filho e ofereceu carona aos amigos
dele, que entraram no carro rapidamente. Assim que Rodrigo arrancou com seu
carro, um caminhão desgovernado invadiu em alta velocidade e bateu
violentamente contra o ponto de ônibus, exatamente no lugar onde os três
garotos estavam sentados.
Tudo que Neyla pensava naquele
momento é o que falaria para o filho mais velho quando ele a visse com o olho e
os lábios inchados.
Ela sabia o estado em que Maicon
ficaria quando visse o que seu pai fizera com ela novamente. Ele crescera
presenciando e sofrendo a mesma violência que a mãe desde que se entendia como
gente, e não aguentava mais. Desde a última sessão de pancadas, ele prometera a
mãe que daria um jeito naquele inferno.
Neyla lembrou-se de cada uma
das palavras do filho, e um calafrio percorreu sua espinha de cima a baixo,
como se alguém houvesse passado sobre seu túmulo, como diziam na comunidade. A
caçulinha Raylane ainda estava com o gesso na perna como consequência da última
vez em que Julião estivera na casa deles.
Ele vinha e ia embora quando
bem entendia, sem dar satisfação sobre o tempo que passara ausente.
Eles sabiam que eram a segunda
família dele, a filial como os vizinhos a chamavam. Mas, agia como se tudo aquilo fosse a coisa
mais normal do mundo. Quando voltava era
sempre a mesma história. Gastava todo dinheiro que encontrava, dormia quase o
tempo inteiro e quando estava acordado bebia até começar a implicar com quem
estivesse ao seu alcance, mas só em casa. Na rua era um frouxo.
Era o segundo mês de Maicon
como caixa de supermercado. O segundo salário que recebia. O primeiro terminara
nas mãos do pai, que achou e confiscou a quantia revirando as coisas da mãe.
Neyla passou o dia inteiro
sendo consumida pelo medo do que aconteceria quando o filho chegasse, visse
Julião dormindo no quarto e os machucados em seu rosto.
Maicon e a mãe tinham uma
relação de amor e confiança profundos. Desde que a irmãzinha nascera, Maicon
nunca mais havia se envolvido com o submundo que os rodeava. Tinha voltado aos
estudos e, desde então, ajudava a mãe a sustentar a casa. Pagava integralmente a
creche em que Raylane passava os dias, enquanto a mãe trabalhava como diarista
em casas particulares.
Quando a noite chegou, Neyla
deu graças a Deus quando Julião acordou, tomou banho e saiu sem falar nada.
Ela teria tempo para tentar acalmar o filho e
evitar uma tragédia doméstica.
Quando Maicon chegou e viu o
rosto da mãe fechou as mãos e socou a própria cabeça com força. Neyla o
envolveu num abraço e ambos choraram juntos. Não falaram nada. Maicon tirou a
mochila das costas, colocou-a no sofá rasgado, deu um beijo no rosto da mãe e
saiu sem dar-lhe o dinheiro do salário. Dessa vez, aquele dinheiro teria outro
destino.
Neyla tentou impedir que o
filho saísse pela porta naquele estado que ela não conhecia, mas pressentia.
Calado, com o olhar crispado e o corpo todo endurecido. Ela sabia o que ele
iria fazer e implorou, sem resultado. Ela perdera totalmente qualquer contato
com ele, que saiu andando como um corpo sem alma.
Maicon rodou por todo o
complexo do alemão, procurando os conhecidos dos tempos em que fora aviãozinho e
fogueteiro do tráfico. Precisava de uma arma, qualquer uma, a qualquer preço
dentro do dinheiro do salário, que não era muito. E ficou rodando pelas vielas
meio desorientado, mas decidido.
Em casa, tudo que Neyla podia
fazer era rezar, pedir, implorar, prometer e buscar no fundo de sua fé alguma
providência que os livrasse da tragédia anunciada.
Ela rezou com toda a fé que
sempre tivera desde muito pequena, acendeu uma vela e ficou ajoelhada durante
as 4 horas em que Maicon ficou fora. E, cada minuto dessas horas, ela rezou
sentido o pavor de que fosse o último. Ela temia por todo a vida que Maicon
perderia fugindo ou preso numa penitenciária, ...caso se tornasse o assassino
do pai.
Nem a pancada na porta,
anunciando a volta de Julião, bêbado, a tirou de sua concentração santa. O
crápula se jogou na cama de casal, sem dizer palavra alguma, apenas emitindo um
grunhido animalesco.
Pronto, pensou ela, o cenário
da tragédia está montado. A primeira coisa que ela fez foi trancar a porta da
casa com todas as voltas que a fechadura podia dar.
O único jeito era tentar manter Maicon do lado
de fora e tentar demovê-lo da ideia de matar o pai. Ela guardou as chaves nos
seios e voltou a concentrar-se em suas orações e promessas.
Santa Rita de Cássia não podia
abandoná-la agora.
Ficou ajoelhada até ouvir o
estrondo da porta sendo arrombada por um chute de Maicon que entrou e foi
direto para o quarto empunhando a
arma já engatilhada.
Neyla o interceptou na porta e quando os dois olharam
para a cama viram o improvável: Julião jazia morto, com a boca e os olhos
arregalados, quase fora das órbitas, com a expressão aterrorizada como se sua última
visão, houvesse lhe arrancado a vida..
Edmir Saint-Clair
Gostou?
Curta, comente, compartilhe e ajude a divulgar nosso trabalho.
Um
cara engraçado, que sabia rir de si próprio como só as boas pessoas sabem. Uma combinação incomum, que misturava coragem
com um jeito atrapalhado. Se a sorte não tivesse se juntado nesse tempero,
teria ido mais cedo para o outro lado.
Uma
pessoa aberta a novos pensamentos. Adorava uma novidade. Um desbravador. Sempre que ouvia
falar em algum lugar novo, fora do “circuito descolado”, punha-se a caminho
para conhecer. De moto, de Kombi ou de Brucutu, um carro equivalente a um Off Road, adaptado por ele nos anos 90 do século 20.
Morador
do Leblon, depois Ipanema, curiosamente era a montanha e não a praia, que o
seduzia. Não era morar na montanha, a onda dele era saltar lá de cima. E Lá em
cima ele encontrou sua praia. E decidiu passar o resto da vida voando. E
passou.
Quando
descobriu que podia ter asas, demitiu-se do cargo de engenheiro civil no
funcionalismo público, que lhe remunerava muito bem e lhe oferecia
estabilidade, para fazer vôos duplos de parapente, em São Conrado, no Rio de Janeiro que tanto amava.
Foi
feliz. Viajou e se aventurou, como gostava, para voar em lugares inusitados.
Coisas do Bode. Bode não, Carlinhos. Que Carlinhos? O Bode.
Teve
a vida cheia de altos vôos e soube fazer suas escolhas valerem à pena. Conservou,
até o fim, a mesma curiosidade adolescente, a mesma alegria ingênua e espontânea. Era capaz de rir e de fazer piadas nos momentos mais difíceis que enfrentou.
Um
aventureiro, corajoso por natureza. Amigo por vocação. Sempre teve muitos porque sabia
ser um amigo dos grandes. Daqueles que a gente pode contar e ligar no meio da
madrugada, fosse para chorar ou para comemorar.
No imaginário popular, não
devemos contar nossas expectativas antes que se realizem, para não despertar olho gordo. Mas, para
mim, ele dava sorte. Todas as vezes que estava esperando o desfecho de alguma situação, uma resposta importante, contava para ele. Sempre me deu sorte.
As
muitas décadas que convivemos, me deram a honra conhecer um ser humano
autêntico e admirável. Um dos momentos mais significativos de nossa amizade, é a
satisfação de ter podido expressar, com todas as letras, pessoalmente, o meu
amor e a minha admiração para com esse irmão que cativou minha alma com sua
essência cheia de bondade.
A ausência já não machuca tanto depois de tantos anos. Mas, nunca vou deixar de sentir saudades.
Ao mesmo
tempo, tenho muita alegria de ter convivido com esse amigo que me ensinou que era possível voar.