Todos os seres humanos sofrem.
Mas, os filhos de narcisistas
sofrem mais, porque sofrem sozinhos e enganados por quem mais deveria amá-los. São
aqueles enganados pelos próprios pais e, por toda a sociedade na qual vivem,
que lhe dizem, todos os dias, que os pais são sagrados e querem sempre o melhor
para seus filhos.
E quando alguém percebe que nada
disso foi verdade em sua vida, quando um ser humano percebe que foi manipulado
por quem mais amava e confiava, se Vê numa queda violenta num nada... sem
fundo.
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Lembro bem que estávamos
andando pela avenida para que você espairecêsse e pudesse desabafar comigo,
como fizera a vida inteira, segura de que seria acolhida como sempre. Falar mal
do meu pai para mim era seguro para você, eu nunca falaria nada sobre o
assunto. Você tinha certeza disso. Ao final de sua narrativa ofensiva, respondi
de pronto como o cão de Pavlov treinado desde que nasceu, com um complemento
que reforçava seu relato, dando-lhe ainda mais impacto e dramaticidade que não
cabiam naquela crítica superficial:
- Você diz que ele age como
“quem gosta de chutar cachorro morto”, disse eu como o cão treinado reagindo à
sineta. No que ela respondeu:
- Frase interessante, nunca
tinha ouvido.
Lembro que a frase a
impactou.
Anos depois, a vida me
mostrou com todas as suas tintas mais carregadas quem realmente gostava de
chutar cachorro morto. E, não se tratava de má interpretação ou qualquer outro
equívoco de julgamento, que uma dúzia de eventos ou várias dezenas de anos,
podem provocar.
Quando olhei para trás, para a
vida inteira, vi que os eventos eram milhares e todos acontecidos na minha
frente.
Como eu nunca percebi? Como
pode alguém ser tão tapado em todos os seus próprios sentidos? Como é possível
alguém ter sido treinado para jamais acreditar sequer no que presencia?
Infelizmente, só percebi após
toda uma vida, e da pior maneira possível, quem realmente gostava de chutar
cachorro morto: era minha mãe.
E o cachorro morto, era eu.