O ORIENTADOR LITERÁRIO é um profissional que acompanha, ensina e participa de todo processo de criação de um livro. Um profissional técnico, especializado em criação, um professor de escrita e um parceiro, ao mesmo tempo. Experimente, é terapêutico e libertador. Perpetue as histórias que só você tem para contar.
Ele
nunca vira sua mãe tão feliz. A formatura do irmão mais novo rompia uma
histórica limitação familiar que nunca tivera um membro formado na faculdade.
A cerimônia prometia ser emocionante e ninguém da família deixara de ser
convidado.
Na
chegada ao local, estavam todos compenetrados e um tanto constrangidos com o
requinte ao qual não estavam acostumados. O padrinho alugara um terno mais caro
do que o de seu casamento com a madrinha. Tia Lúcia, a costureira da família,
estava orgulhosa do fruto de seu árduo trabalho nos últimos 6 meses. Valera a
pena, todas as mulheres da família estavam chiquérrimas.
Ele se
sentiu leve e pleno quando viu a família ocupar uma fila inteira no enorme auditório
da faculdade. Fora o excesso de perfumes, estavam todos com a alma e o corpo em
vestes de gala, para testemunharem aquele evento que realizava a todos.
Quando
o irmão mais novo caminhou em sua direção, vestido com a beca dos formandos, teve
vontade de soltar o maior grito e abraço que já dera em alguém na vida.
O
abraço silencioso e só não foi mais longo porque a organização requisitava a presença
dos participantes no palco para dar início a cerimônia de formatura.
Ele se
sentou na poltrona ao lado da mãe e, quando as luzes da sala se apagaram, se
deram as mãos frias, trêmulas e fundidas na mesma emoção.
E viveram, a família inteira junta, um dos momentos mais felizes que viveram.
Pensando bem, faz muitos anos que nem sequer ouço falar. O Lacerdinha tinha
poucos milímetros e não voava. E o Lacerdinha não transmitia doenças.
Era pretinho e infestava o Leblon, principalmente as transversais, numa
certa época do ano. Minhas lembranças com relação a eles estão ligadas à época
em que eu morava na Rua José Linhares.
No final da tarde, eram cigarras cantando e Lacerdinhas caindo das
árvores. Às vezes nos olhos. Ardia e coçava muito!
Deixava os olhos inchados e nossas mães preocupadas.
Eles eram atraídos por roupa clara, principalmente as amarelas. Por vezes,
atingiam os olhos e provocavam irritação e ardência intensas.
Esses minúsculos insetos eram chamados de Lacerdinhas em referência a um
antigo político carioca, Carlos Lacerda, que fora governador no tempo do estado
da Guanabara.
Descobrimos que os lacerdinhas depositavam suas larvas nas folhas das
árvores, que ainda estavam enroladas e cheias de água da chuva. A gente as
desenrolava e surgiam um monte de Lacerdinhas pequenos em seu interior.
Para mim, os Lacerdinhas despertam uma lembrança muito marcante.
Uma história que me provoca um sentimento muito incômodo até hoje. Eu
tinha uns seis anos de idade e era acostumado a brincar na nossa rua, mas só no
quarteirão, sem atravessar a rua. Havia muitas crianças, tanto no meu prédio
quanto nos prédios vizinhos que faziam parte daquela turminha de meninos da
mesma idade.
Naquele tempo no Leblon, a maioria
das casas tinha uma empregada que morava na favela Praia do Pinto ou na Cruzada
São Sebastião.
Quando, por algum motivo, a empregada da minha mãe levava o filho para o
trabalho, no caso a minha casa, ele se tornava um amigo a mais, que passaria o
dia brincando comigo, meu irmão e nossos outros amigos. No período das férias
escolares isso era bem frequente e, às vezes, a Dona Celestina voltava para a
casa deles na favela da Praia do Pinto e ele ficava e dormia lá em casa com a
gente. Eu e meu irmão adorávamos a presença dele. Era um menino doce, risonho e
engraçado.
Seu apelido era Bilico, o nome era Bernardo, o dia era sábado, dez de
maio de mil novecentos e sessenta e nove, véspera do Dia das Mães.
Dona Celestina e minha mãe estariam ocupadas o dia inteiro preparando o
almoço comemorativo do dia seguinte.
Bilico era mais novo que eu, um ano e mais velho que meu irmão apenas
alguns meses. Era negro com os dentes grandes e muito brancos. Era tímido, mas
engraçado, falava de uma maneira diferente que eu achava legal. Quando Bilico
passava o dia lá em casa fazia tudo junto comigo e meu irmão; assumia a nossa
rotina, almoçava, tomava banho, brincava, lanchava, descia para brincar conosco
e era sempre muito divertido.
Nesse dia, Bilico chegou cedo, tomou café conosco e descemos pra rua pra
brincar. Era época de Lacerdinha.
Dentre os garotos que brincavam na rua, tinha um que era especialmente
assustador para mim e meu irmão. O Arlindo era mais velho, mas não andava com
os garotos da idade dele. Andava conosco, que tínhamos uns dois anos a menos.
Nessa idade, isso faz uma grande diferença.
Gostava de nos intimidar e bater. Ninguém ficava com pena quando o pai
dele aparecia chamando-o, sempre gritando e batendo nele.
Nós também tínhamos medo do pai dele.
Nessa tarde, estávamos catando Lacerdinhas nas árvores. Abríamos as
folhas e ficávamos observando os Lacerdinhas se mexendo lá dentro.
De repente, o Arlindo pega uns Lacerdinhas com o dedo e enfia com
violência no olho do Bilíco, que observava bem de pertinho.
− Tá com fome? Come neguinho
esfomeado!
Arlindo falou aquilo com mais raiva do que lhe era peculiar, todos nós
tomamos um susto. E ele nem conhecia o Bilíco...
Bilíco começa a coçar o olho e a chorar com a ardência intensa.
Todos os meninos começaram a rir. Menos eu, meu irmão e o Bilíco, que
saiu andando e chorando na direção da portaria do nosso prédio.
Lembro que me veio um sentimento estranho e desconfortável que eu nunca
havia experimentado antes - anos mais tarde eu saberia que aquilo se chama
constrangimento - e que nunca me saiu da memória. Eu senti vergonha. Vergonha
de não ter defendido o Bilíco, ele era meu amigo.
Bilíco não subiu para nossa casa, ficou num canto da portaria chorando
baixinho. Falou que se chegasse lá em cima chorando e com o olho inchado sua
mãe iria brigar com ele. Ela recomendava-lhe sempre que não queria que ele arrumasse
confusão com os "filhos das madames".
Depois de algum tempo, ele parou de chorar e subimos. Pela escada. Naquela
época, os empregados e pessoas negras de cor" só podiam subir pelo
elevador de serviço.
Mas o Bilíco só subia pela escada, tinha medo de elevadores.
Quando chegamos em casa, a
primeira coisa que Dona Celestina viu foi o olho do filho inchado e muito
vermelho. Não falou nada, mas fechou a cara. Chamou o Bilíco para a cozinha e
de lá só o vimos de novo quando eles foram embora, bem mais tarde. Lembro-me
bem da expressão de choro dele quando se despediu da gente.
Aquele sábado me marcou para sempre.
Naquela mesma noite, um misterioso e devastador incêndio irrompeu e tomou
conta da favela onde eles moravam. Queimou por toda a madrugada e por muitas
horas seguintes, consumindo tudo e deixando centenas e centenas de famílias sem
teto e sem nada. Era dia onze de maio de mil novecentos e sessenta e nove, Dia
das Mães.
A casa da Dona Celestina e do Bilíco pegou fogo e virou cinzas, junto com
toda a favela da Praia do Pinto, que queimou inteira.
Não sobrou nenhum barraco
de pé.
Dona Celestina nunca mais voltou, e o Bilíco nunca mais veio passar o dia
conosco.
Todos
gostaríamos de ter nosso próprio anjo, exclusivo, nos protegendo, nos
acompanhando e fazendo nossa guarda dia e noite.
Com
este guia prático você vai ver que isto é possível, basta vencer a barreira do
absurdo. Isso é muito fácil, já que ela não existe mesmo.
Para
começar a procurar seu anjo faça o oposto, identifique seu demônio particular. Esses dias estressantes facilitam bastante essa tarefa, e a toda hora ele se manifesta. Primeiro, perceba
que seu principal antagonista é você mesmo. Somos nossos piores e mais
implacáveis sabotadores e críticos. Se a gente pudesse quebrar a própria cara,
de vez em quando, não seríamos assim.
Por
isso, se não podemos vencê-lo, juntemo-nos a ele, no caso, a nós mesmos. Às vezes, transformamos nossas próprias vidas num verdadeiro inferno, como se estivéssemos com o diabo no corpo, nesses momentos, não vacile, atraque-se com seu capeta e mostre quem manda na porra toda.
A
primeira providência é, numa ocasião propícia, convidar seu crítico para
conversar. Ofereça-lhe um chazinho, todo crítico adora um chazinho. Durante a
conversa, faça-o ver que ele o está se criticando muito severamente e revele a
grande verdade, ele é você. No começo ele pode relutar um pouco, mas depois,
fatalmente terá que concordar. Ou então, se interne logo porque seu caso está
perdido. E, não adianta partir para a agressão, eu garanto que você vai
apanhar.
Passada
esta fase meio insana, vamos para a segunda etapa.
Que é,
ainda, mais insana.
Essa
prática seguinte tem suas vantagens. Você pode praticá-la em casa, sozinho, não
paga dízimo e não tem sermão de ninguém, nem tem que ler nada. E não precisa
ver programa de pastor gritando em canal de televisão.
O
incenso é opcional, não é necessário.
Agora
vamos lá; na sua sala ou quarto, fique o mais relaxado que puder, sente-se no
chão e assuma a posição de Lótus.
Pode
ser também a posição de Ferrari ou McLaren.
Essas
posições importadas geralmente são bastante confortáveis. Mas, tem gente que se
arranja bem até com a posição Fiat Uno. Tem que ter muito mais flexibilidade, é
claro.
Ah,
antes coloque um som instrumental que você goste, porque se deixar para colocar
depois de fazer a posição escolhida, vai dar o dobro do trabalho.
Comece
a pensar em quantos Eus existem em você.
Acesse
as memórias de você quando criança, imagine que está se encontrando com ela,
com a criança cheia de sonhos que você foi, convide ela para brincar, pergunte
o que ela sente, o que ela precisa, o que lhe falta.
Chame
seu autocrítico, também, e apresente-o a ele mesmo. Perceba toda a abrangência de sua própria pluralidade.
Desculpe
seus erros, faça um pacto de amizade consigo. Faça a paz entre todos os seus
Eus.
Grande
parte das pessoas esconde sentimentos de si mesma. Ou seja, nem amigos
confidenciais de si mesmos são.
Essa é
a pior solidão, a ausência de si mesmo.
Temos
que nos aceitar, ficar do nosso lado, isso é fundamental. Mesmo quando não
compreendemos por que fizemos aquela merda colossal! Quanto mais difícil é uma
situação, mais fortemente precisamos contar com nosso próprio apoio. Sem o
acolhimento e a amizade de si mesmo, não há santo, nem anjo, que aguente viver.
Seu
anjo da guarda existe e está esperando por esse encontro, há tanto tempo quanto
você.
Agora,
levante-se e fique bem em frente ao espelho.
Se olhe com toda a atenção, sem
pensar em nada, apenas se olhe, sem pressa, vá se reconhecendo, lentamente, em
cada mínimo detalhe, até se enxergar profundamente, com os olhos de sua própria
alma.
E,
então sorria.
Imediatamente,
você verá o seu anjo lhe sorrindo de volta.
Janeiro de 1985. Verão quente, ano novinho em folha e o
maior festival de Rock de todos os tempos há pouco mais de uma hora de
distância de pular do meu mais improvável sonho para o maior palco que eu já
havia visto na minha frente.
Uma linha especial de ônibus foi criada, exclusivamente,
para levar o público do festival, coletando-o a partir de vários pontos
determinados do Rio de Janeiro.
Eu e uma galera gigante do Leblon, terminamos de lotar um
dos ônibus logo no primeiro ponto. A tensão, a expectativa e a proximidade de
algo tão especial gerava o tipo de ansiedade mais saudável que existe, aquela
que nos faz entender totalmente a expressão "rindo à toa". No ônibus cheio, os sorrisos à mostra eram
tão evidentes, que a impressão é que alguém contou uma hilária e interminável
piada. Qualquer movimento virava motivo para uma gargalhada.
Chegamos ao local do festival ainda dia claro, poucos
minutos antes dos portões serem abertos. Todos os dias o ritual era o mesmo. Os
portões se abriam, passávamos pelas roletas e pela revista da segurança, que só
estava interessada em coibir armas e objetos metálicos.
Cigarros podiam, de todos os tipos.
O pôr do sol foi deslumbrante, com ultraleves voando por
sobre um público jovem e absolutamente extasiado diante da grandiosidade de
tudo em volta. A paisagem, o sol se pondo nas montanhas da cidade maravilhosa e
os primeiros acordes da música tema do festival tocando numa altura e qualidade
de som que o Brasil nunca havia ouvido.
"Todos numa direção, numa só voz, numa canção
Todos num só coração, num céu de estrelas...
Se a vida começasse agora, se o mundo fosse nosso de vez,
Se a gente não parasse mais de sonhar...de cantar....de
viver."
E todos cantavam com a propriedade contagiante e autêntica
dos jovens dos anos 1970 e 80, que viviam numa cidade que desejava Paz e Amor e
acreditava nisso, por mais ingênuo que, hoje, isso possa parecer.
E, foi nesse clima que assisti a um show mágico e
maravilhoso do cantor James Taylor, num sábado ainda sem chuva, num céu
completa e absurdamente estrelado, sentado ao lado de dezenas de amigos que
ouviram aquelas mesmas músicas, comigo, nas festinhas de adolescentes.
Foi um dos shows mais emocionantes que já presenciei.
Aquela noite, houve uma catarse gigante entre o público e
um James Taylor extasiado diante de 250 mil pessoas que cantavam junto suas
músicas. Ele estava vindo de um período de declínio acentuado na carreira, e
naquela noite, aconteceu sua redenção.
O sucesso daquela
apresentação teve uma repercussão tão grande e impressionante que impulsionou
novamente sua carreira, e ele sentiu isso ainda no palco, durante a
apresentação.
E externou essa emoção através da sua arte, presenteando o
público com uma apresentação emocionada, emocionante e perfeita, e muito mais
longa do que o que estava previsto.
Tocou e cantou com o entusiasmo de um iniciante, todos os
seus grandes sucessos, não faltou nenhum.
O que se passou foi
sublime, uma poesia em forma de vida.
Público e artista vivendo, durante mais de duas horas e meia,
a mesma intensidade de emoções que ficaria, para sempre, na história de ambos.
O primeiro Rock in Rio me presenteou, ainda, com um show
inesquecível da banda inglesa QUEEN, onde foi feita a histórica filmagem do
coro de mais de trezentas mil pessoas cantando a música “Love of My Life”,
perpetuando aquele como um dos grandes momentos da carreira da Banda e do
lendário Fred Mercury.
Presenciei ele, e todos os músicos da banda QUEEN, ficarem
em absoluto estado de graça e completamente extasiados com o que estavam
assistindo. A emoção deles era visível.
Eu vi, estava lá e cantei junto.
E, no último dia, assisti, pela primeira vez, a banda que
mais toca a minha alma: a lendária banda inglesa YES.
A emoção mágica que senti vendo aquela apresentação incrível
e deslumbrante, permanece até hoje.
Foi perfeito para fechar o último dia do maior festival de
Rock de Todos os Tempos.
Essa é a minha parte da história de um Festival que ficou
para a história de muitas e muitas gerações e virou uma lenda no mundo inteiro.
De
repente, ele se deu conta que as coisas começavam a entrar num sincronismo que há
muito não existia. Pequenos detalhes se encaixando no momento certo.
O
sabonete, que acabava no meio do banho, agora tem outro novinho à mão. A toalha,
que ele não se esquecera de pegar, a mesma que só se lembrava de não tê-la pego
quando estava fechando o chuveiro. O banho, que sempre lhe trouxe bem estar, ainda
mais no verão carioca. A depressão havia lhe tirado todos os prazeres, até o da
higiene.
De
repente, o encadeamento dos eventos rotineiros parecia entrar em sintonia, um
acontecimento não atrapalha mais o outro, agora, todos parecem se complementar.Ele começou a perceber um aumento na
capacidade de tomar pequenas decisões, como a que o fez comprar o sabonete
antes que o outro acabasse, como era comum acontecer. A depressão lhe tirara a
capacidade de decidir sobre tudo e qualquer coisa.
Seu
cérebro estava se curando, buscando a estabilidade, a homeostase, se
consertando.
Ele
sabe que se não atrapalhar seu cérebro, tudo vai continuar a entrar, cada vez
mais, em sintonia.
Sintonia com o quê ou quem?Consigo mesmo. Com a sensação de se bastar,
de não precisar de nada além da água caindo sobre seu corpo para ter aquela
sensação de plenitude que sentia naquele agora.
Percebeu
que estava fora do inferno. Um profundo alívio, do qual sobreveio uma leveza
indescritível.Perdeu o sentido de
urgência, a ansiedade se dissipou.
Não
foi mágica, foi ajuda, pedira socorro. Sozinho, teria morrido. Foi terapia, foi
neuropsicologia. Foi a ciência que ajudou seu cérebro a se curar, deixando-o
ser maravilhosamente fantástico como o de todos os seres humanos, permitindo
que se reprocessasse e arrumasse toda a bagunça. A ciência fora capaz de lhe
curar, intercedendo, efetivamente, na desensibilização e reprocessamento de
traumas que lhe afetavam muito mais do que supunha sua vã filosofia.
Até
aquele momento, ele não acreditava que sairia daquele mundo de horror chamado
depressão. Ninguém que esteja passando por ela acredita que possa vencê-la, faz
parte da doença.
Naquele
momento, a água, o sabonete e a toalha lhe mostraram que ele estava de volta à
vida.
É assim que o Sr. Otávio é conhecido e cumprimentado por
todos naquele quarteirão de Copacabana. Seu Tatá é conhecido por todos os comerciantes
legais e ilegais daquela região. Depois da morte da esposa, a manifestação de
solidariedade de todos o deixou ainda mais próximo e grato a todas aquelas
pessoas que o adotaram. Graças ao apoio que recebeu, em vez de se trancar em
casa, passou a circular pela região só para conversar com o pessoal. Após o
luto, recuperou-se de tal forma que poucos poderiam imaginar.
Não tinha filhos,
morava sozinho e tinha uma aposentadoria que lhe bastava. Mas, o que mais
colaborou para a recuperação do seu Tatá, depois da viuvez, foi o reencontro
com os amigos da juventude que ainda estavam vivos, depois que a filha do vizinho
o convenceu a comprar um notebook e abriu uma conta para ele em todas as mídias
sociais.
Ele se deslumbrou. Passava horas e horas procurando antigos
amigos, namoradas, conhecidos, recortes de jornais de época, vídeos antigos e
tudo mais que fazia parte de sua memória afetiva. Em algumas tardes, voltava no
tempo.
Segundo seu médico, ele vinha apresentando melhoras em todos
os índices e marcadores que os exames podem mostrar. Seu estado de espírito
parecia ter sido mergulhado na fonte da juventude. Para completar o quadro, encontrou
5 amigos que ainda estavam vivos, pelo facebook e, pasmem, que ainda moravam em Copacabana.
Passaram a se encontrar todos os dias na praça do Bairro
Peixoto, onde se divertiam e partilhavam memórias e vivências.
Seu Tatá parecia ter voltado à juventude. Até o dia em que
acordou com o barulho de máquinas bem embaixo de sua janela. Era no terreno ao
lado, que estava sendo preparado para virar um galpão para estacionamento.
Ele aguentou o barulho por vários dias, apesar daquilo o
irritar profundamente.
Mas, fazer o quê? Pelo menos durava só até umas 5 horas
da tarde.
Até o dia, ou melhor a noite, em que a obra do piso
cimentado estava no final e três máquinas semelhantes a grandes enceradoras domésticas
antigas, do seu tempo, invadiram a noite com seus barulhos não muito altos, mas
extremamente irritantes.
Quando Seu Tatá acordou de um cochilo, às 8 horas da noite,
as máquinas ainda estavam trabalhando e aquilo o irritou ainda mais. Com
certeza, aqueles infelizes iriam até às 10 da noite com aquele barulho. Se não
parassem ele ligaria para a polícia, afinal é para isso que existe a Lei do silêncio,
pelo menos na época dele existia e as pessoas e as obras respeitavam certas
convenções de boa vizinhança.
Às 10:30 da noite não havia nem sinal de que as máquinas
iriam parar. À essa altura, Seu Tatá já estava bastante irritado e sentia-se
enraivecido como há tanto tempo que nem se lembrava mais. Pegou o telefone para
ligar para a polícia e pensou que de nada adiantaria. Iria demorar tanto até a
polícia chegar, se chegasse, que os operários já teriam parado e de nada teria
adiantado sua irritação e o chamado telefônico.
Mas, ele precisava fazer alguma coisa.
Foi até a geladeira se lembrando de como era bom ter sido
um moleque bicho solto...Só de pensar no que iria fazer sua pressão arterial
diminuiu, sua glicose baixou e quase teve uma ereção.
Pegou uma caixa de ovos, apagou as luzes do apartamento,
fechou as cortinas, mas não as janelas. E começou a jogar os ovos nos três
homens que operavam as máquinas e em mais um que fiscalizava. Jogava e se escondia,
rindo sem parar. Cada ovo jogado era uma sessão de risadas. E o velho tinha uma
excelente mira...
O que lhe causou uma crise de riso impagável.
Não precisou mais do que meia dúzia de ovos para que a primeira
máquina fosse desligada e em seguida as outras.
Um
cara engraçado, que sabia rir de si próprio como só as boas pessoas sabem. Uma combinação incomum, que misturava coragem
com um jeito atrapalhado. Se a sorte não tivesse se juntado nesse tempero,
teria ido mais cedo para o outro lado.
Uma
pessoa aberta a novos pensamentos. Adorava uma novidade. Um desbravador. Sempre que ouvia
falar em algum lugar novo, fora do “circuito descolado”, punha-se a caminho
para conhecer. De moto, de Kombi ou de Brucutu, um carro equivalente a um Off Road, adaptado por ele nos anos 90 do século 20.
Morador
do Leblon, depois Ipanema, curiosamente era a montanha e não a praia, que o
seduzia. Não era morar na montanha, a onda dele era saltar lá de cima. E Lá em
cima ele encontrou sua praia. E decidiu passar o resto da vida voando. E
passou.
Quando
descobriu que podia ter asas, demitiu-se do cargo de engenheiro civil no
funcionalismo público, que lhe remunerava muito bem e lhe oferecia
estabilidade, para fazer vôos duplos de parapente, em São Conrado, no Rio de Janeiro que tanto amava.
Foi
feliz. Viajou e se aventurou, como gostava, para voar em lugares inusitados.
Coisas do Bode. Bode não, Carlinhos. Que Carlinhos? O Bode.
Teve
a vida cheia de altos vôos e soube fazer suas escolhas valerem à pena. Conservou,
até o fim, a mesma curiosidade adolescente, a mesma alegria ingênua e espontânea. Era capaz de rir e de fazer piadas nos momentos mais difíceis que enfrentou.
Um
aventureiro, corajoso por natureza. Amigo por vocação. Sempre teve muitos porque sabia
ser um amigo dos grandes. Daqueles que a gente pode contar e ligar no meio da
madrugada, fosse para chorar ou para comemorar.
No imaginário popular, não
devemos contar nossas expectativas antes que se realizem, para não despertar olho gordo. Mas, para
mim, ele dava sorte. Todas as vezes que estava esperando o desfecho de alguma situação, uma resposta importante, contava para ele. Sempre me deu sorte.
As
muitas décadas que convivemos, me deram a honra conhecer um ser humano
autêntico e admirável. Um dos momentos mais significativos de nossa amizade, é a
satisfação de ter podido expressar, com todas as letras, pessoalmente, o meu
amor e a minha admiração para com esse irmão que cativou minha alma com sua
essência cheia de bondade.
A ausência já não machuca tanto depois de tantos anos. Mas, nunca vou deixar de sentir saudades.
Ao mesmo
tempo, tenho muita alegria de ter convivido com esse amigo que me ensinou que era possível voar.
O Brasil é um país de mal-educados, não temos boas escolas
nem um bom modelo educacional, as que temos não dão conta da demanda e,
consequentemente, a multidão de ignorantes e analfabetos funcionais aumenta
diariamente há décadas. Somos um povo que, por esses motivos, é muito fácil de
ser enganado e conduzido por qualquer charlatão um pouco mais articulado.
Nada disso que vemos hoje é novidade. Nada.
A diferença atualmente é que, graças à internet, estamos
descobrindo que a sujeira é ainda muito maior do que qualquer um poderia
imaginar. Alastrou-se por todos os cantos do país. Capilarizou por todo e
qualquer aspecto da vida nacional, todo brasileiro se tornou um corrupto ou um
corruptor em potencial.
O descaramento dos políticos, de todos os partidos, é uma
coisa inacreditável!
A população está atordoada sem saber o que pensar a respeito
da quantidade enorme de denúncias que se sucedem diariamente há décadas,
Ininterruptamente. É a mais indecorosa prova de como o mau pode se banalizar.
Mais ainda naqueles que não tem o esclarecimento básico
mínimo nem para compreender onde aqueles fatos impactam na sua vida diária.
Nosso povo não tem mais a capacidade de entender onde,
quando, como e por quem e está sendo roubado.
Enquanto a desonestidade se sofisticou e se informatizou com
as modernas tecnologias aplicadas para desviar verbas, lavar de dinheiro e etecetera,
o nosso povo está emburrecendo em igual proporção ladeira abaixo. Um completo
paraíso para corruptos e desonestos de todas as classes, todas as etnias e
todas religiões.
O déficit educacional do país é gigantesco. A dívida social,
nesse setor, que todos os mandatários, em todos os níveis e em todos os tempos,
têm com o povo brasileiro, é impagável!
Hoje, choramos por não termos dado ouvidos às grandes mentes
nacionais que sempre afirmaram que só uma educação de qualidade tiraria o país
de um destino de república de bananas. Hoje, somos formados e diplomados em
bananices.
As redes sociais são um desfile de imbecilidades e absurdos sobre
todos os assuntos imagináveis.
Se tivéssemos dado a devida importância às palavras de Darcy
Ribeiro, Rubem Alves e tantos outros educadores brasileiros que tanto nos
alertaram para essa tragédia anunciada, não estaríamos pagando o alto preço que
a ignorância demanda.
É triste constatar como custou, custa e continuará custando
caro, ao país, negar aos jovens uma educação com uma qualidade mínima que os
permita entender a própria vida e o funcionamento de seu país.
É tanta mentira, tanta desonestidade, tanta falta de ética e
de compaixão em nossa vida pública cotidiana que não é exagero dizer que o povo
brasileiro perdeu a esperança.
Fica claro que a banalidade do mal se alastrou para todas as
camadas da população, indistintamente. Entra e sai eleição e continuamos envergonhados
e pagando caro por quem elegemos para nos representar.
Estamos envergonhados do que nos tornamos como povo. Uma
nação que dá um passo para frente e dois para trás. Estamos exaustos de tanto
sermos feitos de palhaços e passados para trás.
Mas não estamos acostumados a lutar pelo que desejamos e
achamos justo. Não lutamos por nossa independência, não lutamos para libertar
os escravos, não lutamos para impor nossa república.
Agora, estamos vendo como é difícil se construir um país
digno e justo esperando que tudo nos seja concedido como benevolência de uma
instância superior.
Queremos tudo de mão beijada, expressão que, tristemente,
serve como uma luva ainda nos dias de hoje.
A expressão “receber de mão beijada”, tem origem no império,
onde quem beijasse a mão e adulasse a nobreza, garantia bons negócios. Desde
então, o puxa-saquismo foi institucionalizado no estado brasileiro. Nunca
evoluímos.
Um povo com todo esse histórico tão pouco favorável é um
prato farto para políticos e toda sorte de desonestos, sempre mais
escolarizados e ardilosos, que impõe suas vontades se utilizando de toda forma
de artimanhas inescrupulosas.
E, quando não conseguem às claras, nos vencem pelo cansaço
ou pelas votações do nosso parlamento no meio das madrugadas, enquanto o país
inteiro está com sua atenção voltada para um jogo de futebol. Um ardil digno de
bandidos.
No Brasil não existem partidos políticos, existem quadrilhas
que atuam na política para roubar e saciar uma sede doentia de poder e dinheiro.
Nesse ambiente completamente prostituído e corrompido quem
não entra na dança não participa da festa...
Essas práticas se repetem em todos os níveis da vida
brasileira. Uns achacando outros quando podem.
Todos achacando e despejando seus recalques em quem vem logo
abaixo hierarquicamente.
Estamos nos tornando um povo feio demais para essa terra tão
linda que a natureza nos deu.
Ele estava bem desanimado, apesar de ter a vida inteira para
ficar desanimado. Depois de mais um dia procurando trabalho, chegou em casa
cansado e com fome.
Ligou a televisão e foi esquentar café para tomar com o pão
que, se ainda não era dormido, já estava bem descansado...fora comprado pela
manhã. Uma reportagem chamou sua atenção para o telejornal. Na saída do turno
de uma empresa o empregado respondia ao repórter:
- A situação está difícil, nossos salários estão muito
defasados. Estamos tendo que tirar leite de pedra.
Enquanto acabava de requentar o café e o pão, resmungou para
a televisão:
O avanço da tecnologia, já nos permite observar o cérebro funcionando em tempo real, respondendo a estímulos provocados intencionalmente e alçando as pesquisas neurológicas até patamares impensáveis há apenas poucas décadas.
Através dessas pesquisas, foram desenvolvidas ferramentas como o EMDR, Brainspoting e uma série de novas técnicas terapêuticas que tornaram os tratamentos psicológicos incomparavelmente mais rápidos e eficientes.
Com todos esses recursos, “a coisa toda funciona muito mais rápido” e os resultados são, verdadeiramente, surpreendentes e animadores.
Uma
das coisas que considero mais difíceis, no processo terapêutico, é identificar
o que realmente sentimos com relação a tudo que faz parte do nosso
universo pessoal, onde cada um está enredado até a alma. Essas teias que nos envolvem
e, por vezes, nos paralisam, são como nós cegos muito difíceis de desatar.
Nas
ocasiões em que afloram, essas marcas traumáticas tem a capacidade de nos tirar
o chão, de nos desestabilizar e de causar grande sofrimento.
Através
das técnicas psicoterapêuticas, é possível tornar todo o processo de cura mais
eficiente quando conseguimos identificar, com objetividade, cada sentimento
despertado por aquele gatinho.
Nomeá-los
em voz alta é uma forma eficiente de encará-los e, a partir daí, promover uma
dessensibilização e um reprocessamento das reações e emoções advindas daquele
nó.
Para
isso, desenvolvi uma forma pessoal de pegar minhas defesas psicológicas
desprevenidas e, assim, conseguir respostas mais profundas.
Um
diálogo interno em voz alta, disfarçado de brincadeira de criança: um programa
de entrevista, comigo mesmo...
Pode
parecer infantil, mas isso é um valor a mais, já que nossa criança esconde
muitas respostas.
Brincar
sempre traz leveza a qualquer ação, ainda mais quando lidamos com nossos
espaços obscuros.
Começo
a brincadeira elaborando as perguntas o mais objetivamente que conseguir, com
foco total no assunto escolhido, no nó, específico, que desejo desatar.
Crio
Perguntas diretas, incisivas, íntimas, pessoais e intransferíveis.
Perguntas tão invasivas que só poderíamos
fazer a nós mesmos.
Quando
formulo as perguntas, meu pensamento é unicamente impactar meu entrevistado,
sendo invasivo e indiscreto, com crueza e malícia nas perguntas. Não penso nas
respostas, penso só nas perguntas. O objetivo é claro e transparente: descobrir
o que sinto sobre a lembrança em foco.
As
respostas, por vezes, são de uma obviedade até sem graça, mas outras são
surpreendentes, descubro coisas incríveis. Do choro ao riso, vou me descobrindo
de uma forma cada vez mais leve e profunda.
É
o meu programa do Jô, onde eu sou tudo, o Jô Soares, o Derico, o Bira e,
principalmente, o maior astro daquela entrevista: eu mesmo.
Lembro
de ter lido uma postagem no Facebook muito bem-humorada e inteligente, que tem
muito a ver com esse meu programa do Jô: “Quando for falar mal de mim, me chame.
Sei coisas terríveis a meu respeito. ”
É
exatamente isso. Com a garantia extra de total confidencialidade, que só você
pode se dar.
Experimente,
se conhecer pode ser uma brincadeira deliciosa e, com certeza, vai mudar sua
vida.
Uma relação leve e espontânea
parecia estar surgindo e Clara não queria acelerar aquela evolução que acontecia tão naturalmente.
Era gostoso e divertido toda vez
que se encontravam, o que estava se tornando
mais frequente.
Ela adora a liberdade que a solteirice
lhe proporciona.
Já fizera a felicidade dos pais,
da família, das amigas e a sua própria, realizando o casamento que todos
esperavam, inclusive ela mesma.
Agora, sentia-se livre.
A separação foi sem sobressaltos
e bem menos tristeza do que ela imaginava.
De lá pra cá, pequenos namoros
sazonais a satisfaziam plenamente, acordar ao lado de alguém tornara-se tão
raro quanto indesejado, fazendo com que ela percebesse que novos sentimentos
estavam nascendo naquele momento, depois de um delicioso café da manhã servido
na cama.
Clara deu-se conta que só
conseguia sorver plenamente aquele momento, com a leveza da alma que acorda já
descobrindo-se desperta, exatamente pela raridade da ocasião, por uma conjunção
do improvável com o aleatório;
... um daqueles momentos que
redimem a vida e justificam o caos.
Quando nada se espera e tudo
acontece.
O momento onde o nosso desejo se
encontra consigo e se realiza com a cumplicidade de alguém especial, numa
comunhão harmônica... natural e espontânea.
É preciso aprender a se deixar
levar pela alegria de experimentar a vida dando certo e acertando em cheio.
É preciso saber se sentir feliz,
no momento em que a felicidade está acontecendo.
E gravar, o mais profundamente
possível, cada um desses raros momentos, no infinito da nossa alma eterna
.