Em qualquer de suas formas, a bondade sempre me emociona profundamente quando me deparo com suas diversas manifestações e graus. E são muitas suas formas.
A bondade não precisa de ocasião especial para acontecer. Ela frequenta todos os lugares e ambientes. Não é exclusividade de ninguém, de lugar algum ou de qualquer cultura em especial. É sentida e praticada universalmente.
O efeito terapêutico para quem pratica a bondade é sentida instantaneamente. E contagia a todos os envolvidos, mesmo que só espectadores. Tem um poder extraordinário de agregar, emocionar e inspirar pessoas. Provoca admiração autêntica, inspira autoconfiança e, também, um tipo de satisfação pessoal inigualável e inesquecível.
Ninguém esquece uma bondade recebida, chama-se gratidão.
Mas, também, e talvez até mais, ninguém esquece uma bondade praticada por si mesmo. A lembrança do sentimento experimentado é inesquecível, é um encontro com a nossa mais profunda e bela essência. Ela é responsável por um tipo de felicidade que só a própria pessoa pode proporcionar a si mesmo. É aquela que vem do orgulho pessoal, do reconhecimento de nós por nós mesmos como pessoas dignas da própria admiração.
É através da empatia, da generosidade e da ação efetiva, consequentemente gerada por essas emoções que se materializa o ato que chamamos de bondade.
Presenciar uma cena em que a
bondade esteja sendo praticada explicitamente, é capaz de amolecer e adoçar o
coração de qualquer ser humano.
Para os estudiosos, a cooperação foi a maior responsável pela evolução humana. Necessária e insubstituível. Há pouco, uma antropóloga fez uma descoberta que confirmou, tacitamente, qual foi o marco que documentou o início da formação das tribos, ou seja, dos primórdios da civilização humana.
Segundo ela, o primeiro sinal de que seres humanoides se agruparam e passaram a cuidar uns dos outros, foi a descoberta de um fêmur fraturado e regenerado por cicatrização natural. Em algum daqueles indivíduos pré-históricos, a bondade e a empatia brotaram naturalmente. Não foi ditado por regras ou incentivado por nenhum tipo de crença abstrata. O fato histórico é que o dono daquele fêmur foi cuidado, alimentado e protegido por seus companheiros por um tempo considerado longo para aquele período pré-histórico. Tempo suficiente para que ele ficasse curado e pudesse ser capaz de seguir em frente.
Com certeza, viver em grupo foi por milhares de anos, não só uma escolha, mas, uma necessidade.
Até hoje, esse instinto persiste, nem sempre de forma saudável. Partilho do pensamento de que já não somos, essencialmente, tão iguais aqueles primeiros hominídeos, apesar de ainda conservarmos determinados instintos herdados daquele período.
A evolução humana sempre
trilhou caminhos tortuosos, recheados de doenças, fome, guerras e medo. As
histórias dos povos e nações foram construídas com muitas lutas, mortes,
dominação e submissão dos derrotados.
Os vencidos eram escravizados e passavam a trabalhar para os vencedores, esse era o único objetivo das guerras: pilhar economicamente, e submeter os derrotados para satisfazer aos caprichos e desejos de consumo dos vencedores.
De lá pra cá, as guerras foram sendo substituídas por outros eventos para medição de forças e trocas de ameaças, desde que a consequência de uma guerra bélica passou a representar o risco de extinção de toda humanidade.
Com o advento da propaganda, da publicidade e das estratégias de comunicação de massa, a submissão do indivíduo passou a ser disfarçada e o objetivo principal passou a ser direcionamento dos hábitos de consumo e o incentivo ao seu crescimento econômico, para que ele possa consumir cada vez mais. Ou seja, o objetivo é alimentar o próprio processo, e não o homem que o realiza. Isso vem tornando a vida em sociedade uma eterna e insana competição de todos contra todos.
O vencedor é "quem chega lá". Mesmo que ninguém tenha menor ideia de onde é - "lá" - ou o que isso significa.
A necessidade desse sucesso profissional e econômico abstrato e amorfo, passou a impor, cada vez mais, a todos os indivíduos, um egocentrismo exacerbado que começou a ser visto como normal e admirado. Se olharmos em volta, ninguém mais tem vergonha de admitir que não pensa em mais em ninguém a não ser em si mesmo. Perdemos a vergonha. Qualquer um, já ouviu um sem-número de vezes, a frase imoral:
- Primeiro eu, segundo eu, terceiro eu... e se tiver um quarto...serei eu também.
O conceito vigente é esse, não resta dúvida. Estamos andando sobre o fino fio que separa a insensibilidade social da crueldade pessoal, ao nos depararmos com o sofrimento alheio e não nos sensibilizarmos. Estamos nos Desumanizando, e com isso, caminhando contra nossa própria natureza.
O pior é que esse comportamento tem passeado impune pelas diversas esferas da convivência profissional, pelas “amizades”, pelos relacionamentos amorosos e até nas relações e configurações familiares.
O mal e suas diversas manifestações e disfarces, parecem estar sendo banalizados, como nos bem disse a filósofa Hanna Arendt. Ser insensível virou normal. Lembrando que, para ser insensível é preciso anestesiar nossa sensibilidade nata, parte integrante da nossa essência. É uma imposição cultural insana, que serve não se sabe para quê, nem a quem.
O antídoto para essa insensibilidade, que é a maior inimiga da felicidade, é essa linda característica humana chamada bondade.
A bondade é mágica e natural no ser humano. Ao mesmo tempo em que é gerada por um ato de amor de quem está ativo na ação, gera amor em quem a recebe, e volta para quem acabou de doá-la, sob a forma de gratidão.
A bondade é o amor que se multiplica, que se autoalimenta. Um recurso auto renovável.
Desde a invenção da roda, a maior revolução da história é a tecnologia da internet.
A inteligência artificial e a comunicação sem limites, estão multiplicando possibilidades e unindo a humanidade de uma forma nunca imaginada e possível antes.
Temos visto coisas que jamais veríamos se não fosse essas ferramentas fantásticas. Reencontros entre amigos de infância que jamais se reencontrariam de outra forma, pais reencontrando filhos e pessoas se reencontrando com suas histórias. É a possibilidade inédita de passar nossas vidas a limpo.
É como se cada um pudesse ver aquela parte final do filme que conta a história do que aconteceu com cada personagem depois do fim do filme.
Aquelas cenas adicionais, quando já estão passando os créditos finais, quando a trilha sonora sobe e textos rolam na tela, contando a continuação das histórias de cada um dos personagens, depois que o filme acabou:
- Fulano se tornou um músico de grande sucesso, Sicrano é um médico no interior do país, Beltrana se casou, mudou e nunca mais foi vista, até ontem, quando todos se reencontraram na mídia social da moda...
Mais do que nunca, quem procura, acha o que quiser. No mundo virtual podemos viajar para onde nossas memórias estiverem.
Mas, essa revolução vai muito além dos círculos pessoais, revelando a possibilidade de estarmos presenciando o salto mais gigantesco da evolução humana. Tão grande quanto nunca houve.
Hoje, as possibilidades de mobilização coletiva e de cooperação social são todas as que conseguirmos imaginar.
De todos os continentes, vindos das mais diversas culturas, pessoas comuns estão compartilhando ideias, medos, gentilezas e sentimentos. Compartilhando suas humanidades. Mobilizando-se por causas nobres, valorizando a vida e a dignidade de todos os seres e do próprio planeta.
Se são, ou não, os primeiros sinais de que um ser humano melhor, que sonhamos um dia ser, já começou a se manifestar, isso só o tempo dirá.
É claro que existem os haters,
que disseminam o ódio e seus subprodutos maléficos, usufruindo das mesmas
ferramentas.
Mas Sempre foi assim, na vida real também é, não é novidade. Essa é uma luta eterna.
Torço para que a bondade "entre na moda" e que o ódio cause vergonha.
Se a bondade continuar a contagiar exponencialmente, como está parecendo, e continuar a se alastrar através da internet e de suas inimagináveis evoluções e desdobramentos, o futuro da humanidade será brilhante.
Estamos presenciando um momento crucial na evolução humana.
Acredito profundamente que, se nada interromper essa tendência, no futuro, cada ser humano se tornará guardião de todo planeta, cuidando e protegendo todos os outros seres.
Semelhantes ou não.