Foi minha
primeira adicção. Era vício mesmo, pensava em sundae de marshmallow o tempo
todo. Tinha uns 10 anos e, em tempos de aula, só podia saboreá-los aos sábados
e domingos, quando meu pai nos levava ao clube. No bar da piscina da AABB Lagoa, o
sundae de marshmallow era delicioso, até porque eu não conhecia outro.
Mas,
resumia-se a dois na semana, isso quando meus pais não arrumavam alguma outra
atividade que não incluía o clube, aí a abstinência era ainda maior. Meu sonho
era poder comer marshmallow até não aguentar mais.
Num
certo sábado, quando já tinha uns 12 anos e podia escolher se sairia com eles
ou ficaria em casa enquanto eles cumpriam os passeios recreativos com meus
irmãos, resolvi ficar e cumprir o meu plano de anos, afinal, mais de um ano
naquela idade era tanto tempo quanto uma década de hoje. Tinha economizado minha
mesada e, finalmente, compraria uma lata inteira de marshmallow da Kibon e uma
lata de castanha. Dispensei o sorvete, meu objeto de desejo era o marshmallow.
Fui ao
supermercado e comprei uma lata exatamente igual as utilizadas nas lanchonetes
e uma lata de castanhas.
Nos
anos 1970, a maioria das casas tinha apenas uma televisão, na sala e, assim,
era raro poder escolher o programa. Como meus pais e irmãos haviam saído,
passei a tarde vendo televisão e comendo marshmallow com castanha. Realizando
meu sonho com requintes de luxo e privacidade.
Quando
parei de comer, estava totalmente empanzinado, já quase na metade da lata. Não
cabia mais nem um pedaço de castanha partida.
Passados
alguns instantes, o enjoo foi tomando corpo e aumentando rapidamente, me
causando um extremo mal-estar. Meus pais chegaram a tempo de me ajudar a chegar
ao banheiro e colocar tudo para fora. Passei a noite inteira mal indo do quarto
para o banheiro, num vai e vem dos infernos, e ainda acordei enjoado no dia seguinte.
Literalmente,
do dia para a noite, fui da paixão a aversão total ao marshmallow com tamanha
intensidade que nunca mais consegui comer aquele melado branco e enjoativo,
pelo qual, durante muitos meses, havia sonhado acordado.
De lá para
cá, descobri que se pode enjoar de qualquer coisa, por mais que se goste dela. Seja
abstrato ou concreto. Por muito ou por nada. Por ter demais ou ter de menos. Faz
parte da natureza humana enjoar das coisas. Somos capazes de enjoar de tudo que
há de melhor na vida. Seja de comer, de sentir, de ver, de ouvir, de cheirar ou
de tocar. Simplesmente corremos sempre o risco de enjoar de qualquer coisa, às vezes, do nada, sem motivos. Até da própria vida. Uma infeliz maldição.
A
única coisa capaz de acabar totalmente com um sonho é realizá-lo. E nossa sina é
viver sob o desafio desse grande paradoxo.
Não
deveria ser assim, mas é.
Edmir St-Clair
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